Conjuntos habitacionais
O vídeo "Realengo, aquele desabafo!" mostra a questão dos conjuntos habitacionais subsidiados pelo governo, pela ótica dos moradores - que desconstroem o imaginário popularmente divulgado e aceito, de um Estado paternalista que concede construções novas para os carentes, fazendo assim, um balanço dos pontos positivos e negativos, que acabam sobressaindo nessa nova realidade. Filmado no Rio de Janeiro em 2011, o pequeno documentário mostra como um processo relativamente pequeno de reassentamento de 598 famílias, envolve todos os agentes produtores do espaço, trabalhado no livro "O Espaço Urbano", de Roberto Lobato Corrêa. Desta forma, me atentarei a traçar e evidenciar a atuação desses agentes face a situação abordada no vídeo da atual comunidade de Realengo.
A relocação gera inúmeras consequências que vão muito além da perda de identidade com a terra e com o vínculo emocional de apoio e amizade com a comunidade de origem. A nível econômico, os proprietários dos meios de produção, em uma lógica capitalista, visam sempre o lucro e sobrepõe muitas vezes o Estado, devido a sua grandeza monetária. Além de diversos fatores como nível de escolaridade e renda que dificultam a entrada do mercado de trabalho, esse agente vai acabar evidenciando ainda mais as diferenças quando, como no caso de realengo, os patrões demitem os funcionários para não terem que arcar com o custo de quatro ou mais conduções por dia. Nesse âmbito também se encontram os proprietários fundiários , que pensam só em lucrar com o valor de troca da terra, pouco se importando para o uso da mesma. Recebendo os diversos benefícios do Estado, eles se sujeitam a atuar como promotores de segregação, criando habitações superlotadas e com baixa qualidade de infraestrutura. A nível cultural, os promotores imobiliários, como a Caixa Econômica Federal, que financionou o projeto, restringiu ao máximo qualquer polivalência e virtualidade que o espaço poderia ter de acordo com as diferentes interações e expectativa dos usuários sobre o mesmo. Por meio de um regulamento, ela nivela e engessa os usos do espaço, fazendo com que o novo lar seja apenas uma estática moradia.
O Estado é relatado no livro, como um agente que engloba todos ou outros, sendo ele o mais influente. É sobre seu designo que as condições socioespaciais tão distintas, são criadas, permitidas e perpetuadas. Ele é o responsável em primeira e última instância pela remoção e deslocamento dessas famílias, assim como pelos problemas decorrentes dessa transição tais como o aumento da taxa de desemprego em 33%, da falta de acesso das crianças às escolas locais em 60%, e por fim, pela falta de planejamento ou interesse em amparar a população com serviços como mercado, farmácia e banco, e também com estruturas de lazer. Já os grupos sociais excluídos, é imperioso dizer que estes possuem muito poder em potencial. Historicamente é visto como essa parcela da população luta pelo direito à cidade e pela dignidade de ser reconhecidos como pessoas e não lixo, como fica subentendido no tratamento dado as mesmas, vide o processo de mudança das comunidades: os pertences foram levados pelo caminhão da companhia de lixo do Rio de Janeiro - COMLURB - sem nenhum cuidado. Essa parcela da população precisa ser mais ativa do que nunca e continuar lutando pelos seus direitos, uma vez que a pressão popular ou a própria iniciativa dos moradores é essencial para mudar a mentalidade de hoje frente à idealização dos programas sociais.
Destarte, podemos concluir que todos contribuímos, por ação ou omissão, para a construção dessa realidade, que é passível de mudança. Como mencionado no vídeo, é preciso que o processo de elaboração e efetivação das políticas habitacionais abordem os fatores locacionais e de acessibilidade a serviços, assim como, a questão das redes sociais de solidariedade tão intrínsecas na vida das comunidades mais pobres. Ademais, é necessário ir além da lógica de criar uma espacialidade com o mínimo necessário, é preciso pensar em condições de manutenção a longo prazo e na esfera do desejo: dar abertura ao usuário para que esse interfira no espaço adaptando-o às suas necessidades e vontades. Quanto maior a identificação com o espaço, mais estreito será a relação afetiva com o mesmo e, portanto, maior o cuidado.
| Referências Bibliográficas |
* Documentário Realengo, Aquele Desabafo!
* O Espaço Urbano - Roberto Lobato Corrêa